Nunca antes tinha lido nada dele, nem mesmo ouvido falar.
Há dias, nas habituais e incontornáveis rondas que faço pelas prateleiras do quarto dos meus filhos quando as insónias se abatem sobre mim como um capacete de chumbo, descobri uma obra sua e o bicho da curiosidade aguilhoou-me os neurónios.
Era 01 H27 da madrugada.
O autor assina Roger Vailland e a obra tem como titulo A Visirova.
Diz-se, nas entradas, que a primeira edição aconteceu nos anos 30 do século passado. Depois foram anos de esquecimento, até 1988.
É de uma leitura corrida; de uma escrita tecnicamente envolvente como a própria estória da Visirosa - uma russa que foi parar a Paris fugida da “revolução” na flor da juventude, nos anos 30, onde fez parte da troupe que na Folie Bergers posava e dançava nua todas as noites para centenas de pares de olhos de homens que a “comiam” com a vista.
Até que um rei a conheceu e quis tomá-la por esposa.
Uma história que roça o rocambolesco, mas revela um profundo sentido de humanidade. Saquei pois o livro da prateleira, dei um help às minhas insonias com uma dose cavalar de café sem agucar, sintonizei um qualquer canal de rádio, atirei-me pesadamente no sofa e pus-me a ler a imponderosa trajectória da Visirova.
Fiquei a ler até ouvir os primeiros trinados dos xiricos nas acácias e os primeiros solavancos dos "chapas" que vêm do Xiquelene em direcção à Baixa.
Olhei por entre as frestas das cortinas e descobri, num renovado deslumbramento, uma nesga de céu imaculadamente azul, de um azul virgem, limpo, leve como que uma receita líquida para lavar a alma.
Li o último capítulo de A Visirova, atirei o livro para cima de uma banco e preparava-me para me levantar e ir a cama quando ouvi um rumor de passos no corredor.
Ela surgiu no umbral da porta da sala, de olhos ainda inchados pelo sono recente, o cabelo descomposto, o peito nu, descalça, de calções de riscas azuis muito cingidos ao corpo e um severo ar de censura:
"Com que então passaste outra vez a noite na sala, hã? Olha: se não me queres mais, por que é que não ganhas coragem de mo dizer?"
Deixei-me abater pesadamente sobre mim, sem palavras.
Compreendi, uma vez mais; que nem sempre que a gente fala se entende.
Pesou sobre nós um silêncio dilacerante. Eram 07H27...
Savana - 13 Março/2009
Há dias, nas habituais e incontornáveis rondas que faço pelas prateleiras do quarto dos meus filhos quando as insónias se abatem sobre mim como um capacete de chumbo, descobri uma obra sua e o bicho da curiosidade aguilhoou-me os neurónios.
Era 01 H27 da madrugada.
O autor assina Roger Vailland e a obra tem como titulo A Visirova.
Diz-se, nas entradas, que a primeira edição aconteceu nos anos 30 do século passado. Depois foram anos de esquecimento, até 1988.
É de uma leitura corrida; de uma escrita tecnicamente envolvente como a própria estória da Visirosa - uma russa que foi parar a Paris fugida da “revolução” na flor da juventude, nos anos 30, onde fez parte da troupe que na Folie Bergers posava e dançava nua todas as noites para centenas de pares de olhos de homens que a “comiam” com a vista.
Até que um rei a conheceu e quis tomá-la por esposa.
Uma história que roça o rocambolesco, mas revela um profundo sentido de humanidade. Saquei pois o livro da prateleira, dei um help às minhas insonias com uma dose cavalar de café sem agucar, sintonizei um qualquer canal de rádio, atirei-me pesadamente no sofa e pus-me a ler a imponderosa trajectória da Visirova.
Fiquei a ler até ouvir os primeiros trinados dos xiricos nas acácias e os primeiros solavancos dos "chapas" que vêm do Xiquelene em direcção à Baixa.
Olhei por entre as frestas das cortinas e descobri, num renovado deslumbramento, uma nesga de céu imaculadamente azul, de um azul virgem, limpo, leve como que uma receita líquida para lavar a alma.
Li o último capítulo de A Visirova, atirei o livro para cima de uma banco e preparava-me para me levantar e ir a cama quando ouvi um rumor de passos no corredor.
Ela surgiu no umbral da porta da sala, de olhos ainda inchados pelo sono recente, o cabelo descomposto, o peito nu, descalça, de calções de riscas azuis muito cingidos ao corpo e um severo ar de censura:
"Com que então passaste outra vez a noite na sala, hã? Olha: se não me queres mais, por que é que não ganhas coragem de mo dizer?"
Deixei-me abater pesadamente sobre mim, sem palavras.
Compreendi, uma vez mais; que nem sempre que a gente fala se entende.
Pesou sobre nós um silêncio dilacerante. Eram 07H27...
Savana - 13 Março/2009
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